Um palco versátil mas sempre preciso e adequado à circunstância, magníficos timbres, muita resolução, e ainda uma presença e pujança muito marcadas.
Audições como integrado totalmente analógico
Nesta secção fiz as audições com um Eversolo A6 Master Edition Gen2, ligado por XLR ao Alpha One, tirando assim partindo de ambos serem completamente balanceados (o que se traduz em mais ganho e muito maior imunidade ao ruído), e com umas KEF LS50 (versão original). A primeira surpresa (positiva, diga-se), foi o controlo remoto - pequeno, simples, ergonómico e elegante, com o «mapa» das funções na parte de trás do mesmo. Ajustar o volume ou alterar entradas foi sempre muito simples com este remoto - é ainda possível controlar diversas funções nos menus do Alpha One usando o remoto, como a igualização, e aí já é um pouco mais complicado, até porque o ecrã do Alpha One não é muito grande, esperando-se que a aplicação venha rápido, onde (em teoria) essas funções serão executadas de forma mais rápida e simples. A segunda surpresa foi que, escolhendo a entrada XLR, não havia som… Fui então em busca dos típicos erros de iniciante que acontecem também aos mais experientes e tudo parecia estar bem, mas… não havia som. Bom, ao final de alguma luta, descobri que a entrada XLR na realidade designa a entrada digital AES/EBU e que a entrada analógica XLR se chama AN XLR - algo confuso, mas nada de grave (seria excelente, no entanto, poder editar o nome de cada entrada).
Comecei por escutar o disco On a Misty Night (2023, Sounderscore, DR11, Peak -1,57 dB, DR11, 24 bits/96 kHz), do contrabaixista Massimo Biolcati, um italiano radicado em Nova Iorque, e aqui em trio com um dos meus tenores preferidos, John Ellis, e com o baterista Jonathan Blake. Muito bem gravado e misturado nos famosos estúdios nova-iorquinos Sear Sound, por Chris Allen, foi um bom teste para o Alpha One, que começou a mostrar aqui algum do seu carácter, com um som bastante musculado e presente, não há nada de laid back ou de aveludado neste Alpha One. Com graves muito potentes (em parte, «culpa» do disco), mesmo depois de igualizar um pouco no Eversolo, um som portentoso na bateria de Jonathan Blake e um belíssimo timbre no tenor de John Ellis, o B.audio fez o Eversolo e as KEF soarem do melhor do que já as ouvi até agora. No tema Lígia, composição magistral do maestro António Carlos Jobim, aqui arranjada mais ao estilo even (tão típico do jazz pós anos 90) que ao estilo bossa, o timbre do ostinato do contrabaixo e do raide de bateria no vamp final é ilustrativo das (muitas) capacidades deste produto, assim como a versão do standard For All We Know, com um excelente som tanto nas escovas na tarola de Blake como nas notas longas de Ellis no saxofone tenor. Um início auspicioso.
Segui depois para o clássico Getz/Gilberto (1963, Analogue Productions, Peak -1,14 dBs, DR11, 16 bits/44,1 kHz), disco não fundador (como alguns pensam) mas ainda assim seminal da Bossa Nova, aqui na versão remasterizada em CD por George Marino nos estúdios Sterling Sound e editada pela Analogue Productions (a minha versão preferida, das muitas que há desta disco). O som muito directo, imediato e encorpado do Alpha One voltou aqui a mostrar-se e a confirmar que não tinha sido apenas no disco anterior que estas características se destacavam, elas são mesmo intrínsecas a este amplificador - no tema Para Machucar Meu Coração, um dos mais (injustamente) esquecidos desta gravação, a incomparável voz de João Gilberto soa como se estivesse a cantar a poucos metros de nós, com um timbre e realismo fora de série. Também o som quente de Stan Getz no saxofone, em destaque na introdução de O Grande Amor a interpretar e belíssima melodia de Jobim, tem timbres e transientes absolutamente irrepreensíveis - sendo que no solo, a meio do tema, o Alpha One revela-se muito transparente e não esconde a agressividade natural do saxofone quando Stan Getz o sopra com mais convicção, e todos que já tiveram a sorte (ou o azar) de ouvir um tenor a ser soprado com convicção perto dos seus ouvidos, reconhecerão aqui o profundo realismo desta reprodução. Experimentei em seguida ouvir o mesmo solo mas igualizando o Eversolo com o famoso «B&W Dip», com uma atenuação de 4 dB entre os 2 kHz e os 4 kHz, como é comum em algumas (mas não todas) todas as colunas modernos da marca britânica, e o som do tenor foi muito suavizado nos seus picos mais intensos, com o Alpha One a demonstrar ser muito fiel às fontes precedentes. Poderá ser, e note-se que aqui estou apenas a teorizar, que algumas das colunas da B&W que tenham esta curva característica nos médios, combinem bem com o Alpha One, contrariando um pouco o som mais musculado e presente deste amplificador.
Na música clássica decidi mudar para o Qobuz e, tirando partido do Qobuz Connect, decidi ouvir o grupo The Heah Quartet e o disco Béla Bartók: Complete String Quartets (2017, Harmonia Mundi, 24 bits/96 kHz), duas horas e meia de música absolutamente genial, muito bem interpretada e gravada. E foi provavelmente aqui que o Alpha One mais brilhou, particularmente no campo mais relevante, as dinâmicas - soberbamente reproduzidas, com muito detalhe e precisão em ambas as direcções (crescendos e diminuendos), e uma capacidade invulgar de reproduzir as passagens mais calmas sem que se note nenhuma perda de informação. Os timbres, também eles essenciais num quarteto de cordas, estiveram também em excelente nível, sendo particularmente impressionante a capacidade que tive em distinguir o violoncelo e a viola, dois instrumentos que se «embrulham» mais facilmente em sistemas com menos fidelidade, e o brilho intenso do registo mais agudo dos violinos.
Audições ao streamer
Nas audições ao streamer alternei entre dois sistemas, para tirar conclusões mais alargadas - tendo ligado o Alpha One às mesmas KEF LS50 mencionadas acima (modelo original) e também a uma Diptyque DP140 Mk2. Comecei esta secção das audições a ouvir o disco Keepers of the Eastern Door (2025, Analog Tone Factory, Peak +0.17dB, DR13, 24 bits/192 kHz), de outro dos meus tenores preferidos, e criminosamente desconhecido por muitos, o americano Chris Cheek. Apesar de ter sido gravado por James Farber e masterizado por Bernie Grundman, dois nomes muito fortes, e numa editora de nicho que grava tudo em analógico, sinto que este disco tem alguma falta de claridade nos agudos (em ambos os sistemas) e aproveitei para testar a igualização do Alpha One, aumentando um pouco (2 dB) os agudos na região dos 5 K. A igualização funciona muito bem e é muito transparente, mas de facto não é muito prática de usar através do remoto - tenho a certeza que o será na aplicação. Quanto ao processo SJR, para remoção de jitter, deve funcionar muito bem (não encontrei medições online) porque não detectei quaisquer artefactos no som - embora seja justo aqui mencionar que a rejeição de jitter (e a reprodução PCM em geral) é um problema resolvido aos dias de hoje, com até DACs e streamers muito acessíveis a demonstrarem excelentes medições neste departamento. Dito isto, o timbre do tenor de Chris Cheek e da espacial guitarra de Bill Frisell foram reproduzidos de forma magnífica por este B.audio, assim como os transientes na bateria de Rudy Royston. Também a sensação de palco, com bastante coesão mas com cada instrumento perfeitamente claro na sua localização, foi um bom trunfo do Alpha One - consequência também de uma boa gravação e produção.
Segui depois para o pianista sul-coreano Seong-Jin Cho, cortesia do protocolo Qobuz Connect, com o disco Ravel: The Complete Solo Piano Works (2025, Deutsche Grammophon, 24 bits/96 kHz), cujo nome não necessita de mais explicações. Um dos pianistas mais conceituados da nova geração, a dedicar-se a um dos melhores compositores «impressionistas», numa das melhores editoras de música clássica do mundo - um desafio para o Alpha One, certamente. O timbre do piano, irrepreensível, nítido e natural; também as dinâmicas, à semelhança do que se tinha passado no disco de Bartok referido anteriormente, foram magistralmente reproduzidas e é precisamente neste departamento que se separa o trigo do joio no que toca a amplificadores; voltei, no entanto, a sentir transientes ocasionalmente presentes e percussivos, e voltei a introduzir o «B&W Dip» referido anteriormente, novamente usando a igualização do próprio Alpha One, e o som ficou mais suave e um pouco mais do meu agrado (mas também menos realista). A igualização, diga-se, voltou a revelar-se não só muito útil mas também muito transparente.
Avancei depois para um disco que já usei noutros testes, o clássico Wish You Were Here (1975, versão japonesa 35DP 4, Peak -3,80 dB, DR12), «ripada» de CD e ao qual foi retirado o pre-emphasis que continha. O meu disco preferido da banda britânica, particularmente nesta edição, e as suas características muito espaciais foram «fáceis» para o Alpha One, que o tocou como ele merece, com um palco muito grande, uma excelente imagem estéreo e perfeita localização de casa instrumento - e também com dinâmicas muito naturais, particularmente nos diminuendos. O timbre da strat de Gilmour, um dos mais bonitos da história do rock, esteve irrepreensível, assim como o dos muitos sintetizadores - nos transientes, desta vez, não senti qualquer necessidade de colocar dips, o som mais aberto e presente do Alpha One combinou na perfeição com este disco, diria até que foi de um realismo notável.
Para terminar esta audição, e ainda no Qobuz, decidi ouvir o clássico The Tennessee Waltz, interpretado por Allan Taylor, famoso cantautor britânico, numa gravação de excelente qualidade, à qual apenas se pedia apenas um pouco menos de compressão. Novamente sem igualização, o Alpha One volta a revelar-se mais do que à altura dos acontecimentos, com belíssimos timbres na voz, guitarra e dobro - e excelente separação instrumental também. Também a natureza mais intimista da gravação (e da interpretação) foram muito bem reproduzidas, o que por vezes é uma dificuldade em produtos nesta gama de preço (tudo soa «grande», mesmo quando não é suposto), e mostrando uma versatilidade importante num «tudo em um».
Em jeito de conclusão, não senti grandes diferenças entre o uso das KEF LS50 e das Diptyque DP140 Mk2, isto dito não no sentido de não haver diferenças de qualidade evidentes entre as colunas (grave era se não houvesse, tendo em conta a disparidade de preço), mas no sentido de que senti que as características mais marcantes do som do Alpha One se mantiveram muito consistentes com ambas as colunas, sendo evidente que as Diptyque as revelaram com muito mais clareza.
Audições ao servidor/DAC
Enquanto servidor, e para que este teste não se torne demasiado longo, todas as escutas que fiz reflectiram as qualidades descritas acima no streamer, não tendo notado diferenças de som muito significativas entre usar o meu servidor externo (MinimServer a correr num NAS) e o servidor interno do Alpha One (pen USB), escutando (e comparando) exactamente os mesmos discos (sendo que o MinimServer converte os meus FLACs para WAV em 32 bits e o servidor interno do Alpha one lê os FLAC nativamente, até à conversão Delta-Sigma, claro). Exactamente o mesmo é verdade para os testes que fiz com o DAC, usando a entrada USB e o Eversolo A6 Master Edition Gen2 como transporte. Daqui se conclui que, quem pretender usar este Alpha One como DAC ou como servidor, terá exactamente a mesma qualidade de som que descrevi acima usando o streamer, o que são óptimas notícias.
Foto 7
Conclusão
Testar produtos nesta gama de preço - que, diga-se, seria considerada High-End não há muito tempo, hoje em dia isso já não é tão claro - é uma tarefa difícil e algo ingrata. Valores desta dimensão têm um significado completamente diferente de pessoa para pessoa e não me cabe a mim julgar se um produto é caro ou barato, dada a relatividade inerente aos conceitos. Sobra-me então discorrer sobre os méritos (ou falta deles) de um produto, tanto na óptica sonora como na óptica funcional, reservando ao leitor decisões de «valor».
De um ponto de vista funcional, o Alpha One portou-se de forma praticamente irrepreensível - excelentes protocolos de streaming, e uso sem falhas de amplificação, servidor e DAC. Repito aqui notas já feitas anteriormente - o uso da igualização necessita muito da aplicação (que me foi garantido que irá ser lançada, embora não já...já) e os ruídos mecânicos são audíveis, para os que sejam mais sensíveis a esses pormenores. De um ponto de vista de design, o B.audio não nos põe de boca aberta, tendo por outro lado a vantagem de também dificilmente incomodar alguém, havendo certamente produtos bastante mais divisivos no mercado - o design reflecte aliás precisamente a natureza altamente funcional e prática deste Alpha One, mesmo o próprio ecrã não mostra a capa dos discos, prática tão corrente desde o surgimento da Eversolo, mantendo a sobriedade e a elegância acima de tudo. E será também provavelmente bastante mais resistente ao passar do tempo - muitas vezes os designs mais modernos perdem algum charme com os anos.
De um ponto de vista sonoro, o B.audio tem um palco versátil mas sempre preciso e adequado à circunstância, magníficos timbres, muita resolução, e ainda uma presença e pujança muito marcadas, dando até a impressão de ser um amplificador com muito mais potência que a especificada. Escrevi acima os adjectivos rápido, imediato e encorpado e são esses mesmos adjectivos que melhor o descrevem - não há aqui espaço para um som mais laid back, romântico ou aveludado, o realismo é a palavra de ordem. Graves potentes e profundos, uma gama média sem os afundamentos de frequência que se vêm por aí ocasionalmente (por intenção ou incompetência, dependendo do caso) e agudos muito definidos e presentes, este amplificador não prima pela discrição - a sua presença é impossível de não ser notada (e atenção que, muitos instrumentos musicais, quando ouvidos ao vivo, não soam nada bonitos ou agradáveis, se tocados com intensidade). Como referi acima, em instrumentos com transientes mais percussivos e / ou agressivos, como é o caso do piano, o uso da igualização interna para criar aquilo que no domínio da Internet se design por um «B&W Dip» ajudou bastante a suavizar o som mais musculado do Alpha One - e, se a B Audio nos proporciona igualização, porque não usá-la? Deve ser notado aqui também que isso não se verificou na maioria dos discos, apenas ocasionalmente, e que, para além de não ter um espaço enorme para as minhas audições, tenho também o hábito de ouvir em nearfield, para minimizar as interacções do sistema com o quarto - é muito possível que, numa sala grande e com uma maior distância entre os sistema e a posição de escuta, esta maior intensidade dos transientes seja significativamente atenuada. E, claro, há sempre o tópico das sinergias - apesar de ter ouvido o Alpha One com dois pares de colunas, e bastante diferentes entre si, há uma infinitude de outras opções no mercado que poderão dar-se melhor (ou não) com as características deste amplificador. Senti aliás, que o Eversolo A6 Master Edition Gen 2, mesmo sem igualização, complementava muito bem o som do Alpha One, criando um perfil sonoro diferente quando comparado com o streamer interno (repare-se que usei o adjectivo diferente, não melhor ou pior). Não fazendo sentido adicionar um streamer ao Alpha One, tenho a certeza que com uma escolha cuidada de altifalantes e o uso inteligente da igualização, é possível retirar uma excelente qualidade de som deste Alpha One, e construir um conjunto do mais simples e moderno que a alta-fidelidade permite no século XXI. Aliás, para quem procura este som presente e ousado num verdadeiro «tudo em um», ao qual basta adicionar colunas, tem no Alpha One um produto simplesmente obrigatório na sua shortlist. Sorte então a dos que podem levar para casa um produto deste gabarito - aos restantes, sonhar é grátis e, quando sonhamos, os únicos limites são os impostos pela nossa própria imaginação.
PS - Deixo aqui uma nota final para agradecer a Sébastien Bermann, da B Audio, pelas rápidas e esclarecedoras respostas às minhas muitas perguntas - é sempre reconfortante saber que as marcas respondem aos e-mails e que o fazem sem subterfúgios. Não é caso isolado (como diziam os Xutos), mas importa sempre realçar.
Amplificador integrado / DAC / streamer B.audio Alpha One
Preço 16 400 €
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