São cabos, senhor
Audições
Nos últimos tempos, e por várias razões, o meu sistema tem tido contacto com algumas marcas de cabos muito boas, algumas que tenho testado a nível pessoal, outras emprestadas a curto e outras a longo prazo, isto, claro, para além das que nele moram.
Com os Kimber Carbon de coluna no meu sistema, foi óbvio desde o início, com o Carbon 8, e depois com os outros dois irmãos, que se tratava de algo muito especial. Senti isso não porque achasse que os Carbon estivessem a injectar o seu próprio som maravilha no meu sistema (algo que, no plano conceitual até podia achar que estivesse a acontecer; mas não foi o caso), mas porque, por várias vezes senti o que estava na presença de uma melhor gravação do disco (e sabemos como a qualidade das gravações é crítica para o som que bebemos no nosso sistema), ou que em vez de um cabo, aparentava ter trocado de amplificador; ou de colunas… Ou mesmo, em duas ou três ocasiões, que estava a ouvir aquela canção - ou mesmo aquele álbum - pela primeira vez…
Kimber 8
A introdução deste cabo no meu sistema provocou um impacto inaudito. Afinal, tenho tido comigo cabos de muito boa qualidade; mas o Carbon 8 superou tudo o que eu esperava. O som, abriu, o palco aumentou, o detalhe, a clareza, a transparência, o silêncio de fundo, enfim, tudo ficou melhor face ao que eu tinha.
Tales é um álbum do virtuoso baixista e compositor Marcus Miller, homem do jazz funk e emérito discípulo de Miles Davis. Como em todos os seus trabalhos, trata-se de música de fusão, em que se entrecruzam o jazz, o funk, o soul e algum rock. A música de Marcus é muito ritmada e sincopada, com a sua guitarra baixo sempre muito visível, a solar mais do que a marcar o ritmo das canções, como costuma acontecer com a generalidade dos baixistas. Neste CD, na faixa The Blues, notei, como nunca me tinha dado conta até aqui, que o Carbon 8 consegue colocar de forma bem delimitada no espaço as vozes de terceiros que surgem no início da faixa, ora à direita e à frente, ao centro e mais acima, ora à esquerda e atrás. A mesma qualidade na localização espacial volta a ser notória com a colocação da voz de Me’Shell NdegéOcello, bem ancorada ao centro e à frente, enquanto um coro feminino acompanha no fundo do palco, entre o centro direita e o centro esquerda. Já na faixa que dá o nome ao álbum, Tales, é notória alguma dificuldade do cabo em permitir a delimitação dos contornos das notas do baixo sintetizado que marca o ritmo da canção, sobre a qual pontificam a guitarra baixo de Miller e o trompete de Michael Stewart. Esta dificuldade voltou a ser visível mais à frente, na canção Visions, e desta feita não só com o baixo sintetizado, mas também com a percussão sintetizada. Foram poucas as vezes em todas as audições em que me apercebi disto, mas algumas canções deste disco tiveram de facto esta característica.
Em I Know What I Like, do álbum Selling England by the Pound, dos Genesis, foi notória a capacidade de o Carbon 8 revelar de forma autónoma o baixo, por um lado, e o bombo da bateria por outro. São duas sonoridades que não poucas vezes se mesclam e confundam; mas não aqui, que o Carbon 8 resolve timbricamente muito bem os dois instrumentos. No início dessa faixa, normalmente aparenta haver apenas uma voz a cantar, mas aqui não, há não só a voz de Peter Gabriel, mas também a de Phil Collins, os dois a cantar em uníssono! Para tirar dúvidas, fui ver alguns vídeos, e sim, lá estão os dois a cantar, por vezes também se juntam ao coro Mike Rutherford e até mesmo Tony Banks, cuja menor aptidão em matéria vocal é conhecida (felizmente compensada com a mestria nos teclados e na composição). Espantoso!
Kimber 16
Satisfeito que estava com o Carbon 8, a passagem deste para o Carbon 16 não pôde, simplisticamente falando, deixar de gerar um enorme WOW! Troquei de amplificador?? Ou apenas aumentei o volume? E removi 3 or 4 véus que estavam à frente das colunas?? Pois com o Carbon 16, tudo (ou quase) fica maior e melhor. Uma maior escala; uma maior transparência; um maior palco, em 3D: largura, altura, profundidade. Um silêncio bem mais negro da tela sonora. Um grave mais notório. E tudo isto a uma velocidade incrível. O impacto da passagem para o Carbon 16 foi bem maior do que o que tinha sentido com a introdução do Carbon 8.
Here to Stay, do CD We Live Here, de Pat Metheny, é uma canção com uma qualidade de gravação inferior à do resto do álbum. Pois com o Carbon 16, essa diferença como que se esbate, e a sua menor amplitude dinâmica aproxima-se das restantes canções do álbum. Na faixa The Girls Next Door, os pratos da bateria de Paul Vertigo e da percussão de Luís Conte ouvem-se bem nas zonas já fora das colunas, à esquerda da coluna esquerda, e à direita da coluna direita. Em To The End of the World, a música desenrola-se entre momentos de menor tensão, em que os músicos tocam mais baixinho, e outros em que se dão crescendos, que culminam com uma erupção, com um ribombar de trovões. O Carbon 16 ilumina tudo isto como até então não tinha visto nenhum outro cabo fazer: os momentos em que a música está mais baixa não perdem dinâmica, nem interesse, mas, por outro lado! Quando os músicos aceleram, e tocam mais alto, culminando nos tais trovões, é todo o sistema que vem atrás; não podendo deixar de empolgar quem está a ouvir.
Mi Tierra, da cantora cubano-americana Glória Estefan, outrora dos Miami Sound Machine, e que vi ao vivo em Lisboa (há 30 e tal anos!), está repleto de belas canções de pendor predominantemente acústico, e de forte inspiração cubana, seja nas melodias como nos ritmos irresistíveis, mas também nos instrumentos. Nestes, o disco é de uma variedade impressionante. Na canção que dá o nome ao disco, temos uma guitarra cubana, uma de 12 cordas e um baixo; três percussionistas, e uma música (Sheila E, que tocou com Prince) nos timbalões e nas congas; dois trompetes, um trombone e uma flauta; um violino e um violoncelo; dois pianos; e finalmente, nas vozes, a própria Glória, acompanhada de um coro com três vozes! Até porque o disco teve uma gravação bem cuidada, ouvir estas canções é uma festa para os sentidos. O Carbon 16 traz à tona a riqueza da música, com uma dinâmica impressionante, um palco gigantesco, que se estende bem para fora das colunas, e uma tremenda correcção tímbrica: não há a menor hipótese de confundir um instrumento com outro. Um trompete soa a um trompete, e um trombone a um trombone; a guitarra cubana é uma coisa, e a guitarra de 12 cordas é outra; e assim por diante.
Em Yours is No Disgrace, do CD The Yes Album dos Yes, logo ao final de poucos segundos, consegui detectar, como nunca, o sintetizador que está lá no fundo, quase escondido por debaixo da massa sonora produzida pelos restantes instrumentos. Centenas de vezes (senão milhares) ouvi eu esta canção, e nunca havia ouvido tal coisa; e, afinal, trata-se apenas do disco que, mais do que marcar o meu primeiro amor musical - os Yes - marcou a minha entrada na música “a sério”, no início da minha adolescência. E eis que agora, num teste a cabos de coluna, dou com este sintetizador a tocar assim, na sua primeira utilização pelos Yes, em 1971, aqui ainda pela mão de Tony Kaye, que no disco seguinte da banda haveria de ser substituído pelo famoso Rick Wakeman. Ele há coisas…
Nils Petter Molvær é um trompetista (e multi-instrumentista) de jazz norueguês que tem vindo a fazer uma curiosa e muito interessante fusão entre o Jazz e a música electrónica. No seu disco Khmer, as faixas Tlon e Access / Song of Sand I são dotadas de percussão sintetizada que se situam bem abaixo das frequências normais da percussão, ou até da guitarra baixo. Aqui, é fácil um sistema resvalar para a perda do controle deste poderoso grave, cuja audição se torna assim pouco mais do uma banda de músicos a tocar sobre um conjunto de borrões de baixas frequências que se vão sucedendo. Ora, não é isso que sucede quando o Carbon 16 é chamado a enviar para as colunas a informação que lhe chega do amplificador. Com ele a intervir, fica tudo mais delimitado e controlado, e por isso mais natural, permitindo acompanhar muito melhor o fluir da música, com a enorme tensão dinâmica que ela aqui apresenta.
I’ve Got You Under My Skin é um standard do Jazz da autoria de Cole Porter, de 1936, que foi particularmente popularizado por Frank Sinatra, décadas depois. Entre os muitos que a cantaram inclui-se Diana Krall; e, com o bom gosto que lhe é reconhecido, que bem que o faz, resultando num arranjo inovador, ao qual, para além dos violinos de que tanto gosta, junta um instrumento de que eu particularmente gosto, o vibrafone. Na sua interpretação desta canção, o Carbon 16 põe este instrumento a tocar, logo nos primeiros acordes, com um timbre e com um ataque a transientes que só os muito bons sistemas conseguem reproduzir, com um agudo muito alto, muito pronunciado, com um «tziiiing» que vibra e quase irrita o ouvido; mas é mesmo isso que faz um vibrafone.
Kimber 18XL
Tal como já antes tinha acontecido com a passagem do Carbon 8 para o Carbon 16, com a entrada do Carbon 18XL no sistema, tudo ficou ainda maior e mais forte, mas também mais transparente… e com um fundo negro ainda mais escuro. E lá foram removidos mais um ou dois véus. A música parece novamente estar a tocar mais alto, a escala aumentou novamente, o grave ficou ainda mais notório, o palco aumentou ainda mais em profundidade, e percebe-se ainda melhor onde estão os músicos, mais à frente, atrás, à direita, à esquerda… Com este cabo no sistema, gera-se uma fantástica sensação de imersão, e a ilusão misteriosa da presença física dos músicos na sala, a quimera com que todos sonhamos…
Em Yours Is No Disgrace, dos Yes, há um momento em que, antes de começarem a cantar em uníssono, se ouve alguém - não se sabe se Jon Anderson se Chris Squire - fazer um ruído com a língua no céu-da-boca antes de começar a cantar que nunca me tinha sido dado ouvir. E, como nunca ouvi antes, as vozes dos dois aparecem bastante distintas e diferenciadas. Também o bombo da bateria de Bill Brufford aparece bem diferenciado do baixo de Squire. O timbre dos instrumentos é agora muito mais claro, permitindo identificar claramente cada um deles. Em Clap ouve-se perfeitamente o «thump» do pé de Steve Howe a bater no chão de madeira do palco, enquanto dedilha a sua guitarra acústica.
Em Dancing in a Volcano, do CD Selling England By the Pound, dos Genesis, o bater de Phil Collins com o pé no bombo da bateria é agora mais notório do que já tinha sido com o Carbon 16, distinguindo-se claramente do baixo de Mike Rutherford; e também se notam muito melhor as batidas metálicas nos pratos da bateria. No início de I Know What I Like, percebe-se ainda melhor do que com o Carbon 16 no comando que que há duas vozes a cantar em uníssono, Peter Gabriel e Phil Collins. Ouve-se também com surpresa a inspiração / respiração de Peter Gabriel à medida que vai soprando a flauta.
A Time for Love, de Melissa Walker já me tinha impressionado muitíssimo quando ouvida através do Carbon 16; mas aqui, ainda um pouco mais, a voz de Melissa e o piano que a acompanha – e “apenas” isso! - Enchem a sala! A pressão sonora que é produzida pelo sistema quase que se equivale, é a sensação que dá, à de um grupo de jazz com vários instrumentos a tocarem em simultâneo. Sente-se o sofá a vibrar com a voz, sim com a voz de Melissa; não é um baixo ou uma bateria a fazê-lo, é um som da gama média, uma voz. Extraordinário!
Com o 18XL, consegui ouvir nuances inesperadas no dedilhado de Lyle Mays no piano de cauda, em passagens muito rápidas da faixa Mirror of the Heart (álbum Lyle Mays, Tidal, 16/44,1). Também tenho este álbum em LP, e nunca delas me tinha dado conta, em várias audições que dele fiz, num sistema que contava com outros cabos de coluna.
Já quase no final das audições, lembrei-me de colocar os meus velhos Kimber 4TC no sistema. Surpreendente, para não dizer mais! Quase metade do desempenho, por 10% do preço! É claro, não há milagres, em comparação com o Carbon 8 (para não ir mais longe, e aumentar a injustiça da comparação), os 4TC tinham um som um pouco subtrativo, com graves mais leves e menos definidos, um pouco menos de ar nos agudos, um palco sonoro mais estreito, e transientes não tão rápidos como os do Carbon 8. Dito isto, o que mais me impressionou foi a consistência da voz da Kimber. Não houve nada de embaraçoso no desempenho desses cabos de mais de 20 anos, pelo contrário. E mostraram um parentesco mais próximo com o Carbon 8 do que seria sequer imaginável pensar. Que pena já não ter comigo os meus 8TC, que troquei por outros de que a História já não reza… Teria gostado de os ouvir no presente contexto. Bem me lembro de ter ouvido alguém dar um conselho a outrem, há bem mais de 10 anos: Tens uns Kimber 4TC, ou 8TC que usaste no teu primeiro sistema, pois podes encontrar melhor, claro, mas guarda-os, nunca os vendas… Eu não fiz isso com todos os Kimber de coluna que tive, mas ainda bem que o fiz com metade.