Uma suavidade de veludo a envolver um punho de aço ou, como o melhor pode ficar ainda melhor.
Audições
Começo já por dizer que em termos de performance sonora o 2.16 ultra é uma verdadeira maravilha. Mas a aplicação Euphony Stylus que vem com ele de origem para podermos aceder aos diversos serviços de streaming já é uma coisa bem diferente, tanto que dirigi ao CEO e fundador da Pink Faun, Jord Groen, um longo email com comentários construtivos sobre as dificuldades que tinha encontrado.
O Euphony Stylus tinha de base algumas limitações.
E tive direito a um prémio muito especial, pois fui o primeiro a nível mundial a experimentar a nova aplicação desenvolvida pela Pink Faun ao longo dos últimos dois anos, em colaboração com a Roon. O update foi feito à distância, apesar de a Pink Faun ter achado mais seguro enviar-me primeiro um módulo SSD de memória NVMe de 1 TB com o sistema operativo pré-instalado. E foi como tal e qual como se passasse a ter a aplicação Roon na minha frente, já com todas as minhas Playlists, isto depois de ter feito logout do Nucleus+, que foi depois desligado por margem de segurança, e efectuado o login no 2.16 ultra. Nos velhos tempos, quando comecei a utilizar o Roon, era extremamente complicado ter a mesma conta em equipamentos separados mesmo fazendo logout de um deles. A Roon melhorou esse aspecto e tudo funciona agora sobre rodas. Aliás, a aplicação instalada no 2.16 ultra é praticamente igual ao sofware de base da Roon, com ligeiros ajustes em termos de interface gráfica, ou talvez nem isso porque mesmo a finalizar este teste recebi o aviso da Roon de que estava disponível um novo update que eu resolvi não instalar naquele momento. Saúdo, aliás, que a Roon finalmente tenha corrigido uma situação da qual eu já me tinha queixado junto deles por diversas vezes: a faixa que está a ser reproduzida dentro de uma playlist está identificada por um ícone gráfico que funciona mais ou menos como um indicador de nível em função da frequência; quando saímos dessa playlist e fazemos uma pesquisa ou outro tipo de operação, seria lógico que, ao regressar a ela, no ecrã continuasse a ser apresentada a página que tínhamos antes com a faixa em reprodução bem identificada mas não era esse o caso – o software da Roon regressava ao início da playlist em causa, o que se tornava muito inconveniente no caso de listas com 300 ou 400 faixas, como tenho várias. Tal foi corrigido e a vida fica então muito facilitada para quem usa o Roon com frequência.
O novo software /aplicação, desenvolvido em conjunto com a Roon, é muito mais fácil de utilizar e tem informações completíssimas.
E que diferença não só nos aspectos operativos e na ergonomia (quem se converte ao Roon nunca mais quer voltar para outra interface), como na qualidade de reprodução temos com esta nova interface: o Damian, que fez o update por actuação remota a partir dos Países Baixos, já me tinha alertado para esta melhoria mas eu não estava preparado para um nível tão elevado de aumento de qualidade sonora, seja em termos de espacialidade, seja nos detalhes, seja na limpidez e transparência. Foi quase de ficar de boca aberta! Tudo terá certamente a ver com as melhorias entretanto implementadas no sistema operativo.
Antes de avançar mais convém deixar aqui algumas indicações sobre o sistema onde o 2.16 ultra foi inserido e detalhes ligados a essa inserção. Esse sistema, o meu já de há alguns anos, era formado pelo conjunto de electrónica Inspiration 1.0, da Constellation, tendo como fonte digital o Roon Nucleus Plus, alimentado pela fonte de alimentação Ferrum Hypsos, com o iFi Audio Pro iDSD como descodificador D/A e renderer de MQA (descodificação completa) e, no domínio analógico, o gira-discos Basis com braço SME V Gold e cabeça Air Tight PC1 Supreme, sendo o prévio de gira-discos o Nagra CLASSIC Phono. As colunas eram as QUAD ESL 63, que alternaram mais tarde com as Diptyque DP 140MkII, e os cabos de interconexão e coluna eram predominantemente da gama Select, da Kimber, com o AudioQuest Thunderbird ligado entre o iFi Audio Pro DSD e o prévio da Constellation. Na alimentação de sector pontuava a régua Vibex Granada Platinum, à qual ligavam todos os equipamentos electrónicos em uso, sendo o amplificador de potência da Constellation alimentado através do cabo Tiglon TPL-2000A. O Silent Power LAn iPurifier Pro que testei muito recentemente continuava ainda por cá (e acho que vai continuar), bem como o cabo de Ethernet AudioQuest Cinnamon.
Como é óbvio a partir da descrição feita, o Pink Faun 2.16 ultra substituiu o Roon Nucleus Plus e, embora a comutação entre núcleos base Roon instalados em equipamentos diferentes seja agora muito mais simples e eficiente, para evitar que o software tivesse que andar tempos e tempos a «bater à porta» do Nucleus Plus e do 2.16 ultra, desliguei de vez este último e a partir daí foi só indicar que o Roon passava a funcionar noutro dispositivo que não esse – a indicação que aparece na interface gráfica é a de «desautorizar» o dispositivo anterior. E, fosse a partir do computador, do tablet ou do telemóvel, sempre que punha em acção o software Roon tudo funcionava às mil maravilhas. Assim deveria também funcionar o Roon ARC mas neste caso, mesmo depois de desinstalada e tornada a ser instalada, a aplicação continua a procurar o Nucleus+ e não há maneira de a convencer que ele não está lá. Um problema a resolver um destes dias e que não tem nada a ver com o 2.16 ultra.
Voltemos então à vaca fria mas antes um pequeno intróito: depois da descrição que fiz da estrutura construtiva do 2.16 ultra pode haver quem torça o nariz ao ter em conta que no interior da caixa tão poderoso e bem desenhada se encontra uma placa-mãe de computador, esquecendo que Jord e a sua equipa se concentraram em resolver a esmagadora maioria dos inconvenientes inerentes à utilização de um computador normal, tais como o ruído gerado pela fonte de alimentação comutada, os erros de transcodificação de formatos, os problemas inerentes à interface USB, e assim por diante. Não há dúvida que este excelente streamer foi desenhado para passar por cima de praticamente todas estas limitações e tem como função primordial ler um ficheiro de áudio de áudio com a melhor qualidade possível. Além disso, convém não esquecer que hoje em dia todas as masterizações são actualmente feitas em computador e que o DXD, o formato utilizado para gravação por alguns estúdios ditos de topo, nem sequer é editável, tendo sempre que ser convertido para PCM para poder ser trabalhado. Aliás en passant, julgo ser interessante mencionar que, tenha isso o valor que tenha porque o tema já foi por demais discutido, encontrei no Qobuz ainda muitas faixas ainda em MQA, o que demonstra que, apesar da Tidal estar a passar quase tudo o que era MQA para FLAC, por vezes mantendo presente o código identificador do MQA, a Qobuz manteve esses ficheiros neste formato sem lhe fazer qualquer modificação.
Um dos aspectos mais impressionantes do funcionamento do 2.16 ultra é o excelente trabalho que ele fez em termos da recriação de imagens sonoras de locais de gravação de grandes dimensões. Recordo-me perfeitamente de ter perante mim uma quase completamente verosímil reprodução da sala onde foi gravada a música para o ballet Gayane, de Kachaturian, um original da Mercury que comprei em CD aqui há uns tempos no CES e já passei para o meu NAS, e da localização dos diversos instrumentos. Na Dança das Senhoras das Rosas, os violinos definiam a parte frontal esquerda do palco como que envolvendo a coluna esquerda e era bastante fácil ter uma ideia a distância deles em relação à parede lateral pelo tempo que o eco levava a chegar até mim. Aliás, esta foi uma situação que poderia descrever aqui para quase todos os naipes de instrumentos, desde as trompas até aos fagotes, à secção de cordas, aos primeiros violinos e assim por diante: de cada vez que uma dessas secções entrava em acção, a sua posição no palco sonoro ficava perfeitamente definida dentro de um determinado arco, com as notas a propagarem-se para fora dele e as harmónicas como que a definirem um halo que envolvia superiormente toda a orquestra.
É um facto mais ou menos evidente que os transientes rápidos e dinâmicos são uma das pistas mais evidentes que o nosso cérebro pode utilizar para distinguir entre a música gravada e a música ao vivo. Estes transientes podem, após as primeiras notas, dar-nos pistas sobre se o som proveniente de uma dada sala, quando estamos no seu exterior, é originado, por exemplo, por um piano real ou por uma gravação. Claro que o 2.16 ultra não transformou a minha sala de audição numa pequena sala de concerto com um intérprete ao vivo lá dentro, nem mesmo com um pequeno grupo, mas a sua reprodução de transientes não pode senão ser considerada como extraordinária. O flanco ascendente de instrumentos tais como o xilofone, os ferrinhos ou mesmo os trompetes, era tão bem definido e preciso que as notas quase que pareciam literalmente dançar no ar. O vibrafone presente na faixa Bag’s Groove, de Miles Davis, bem como a bateria em Evidence, de Art Davis, foram mais dois exemplos nos quais os transientes dinâmicos contribuíram decisivamente para a percepção espacial da imagem. E não foi apenas a velocidade e precisão dos transientes que me soou fora do normal – as amplitudes dinâmicas das notas reproduzidas pareceram quase sempre mais amplas do que aquilo que eu me recordava quando ouvi as mesmas peças com o meu conjunto habitual de streaming. O decair das notas e o seu fluir, no caso das cordas, à medida que estas subiam e baixavam, sendo a peça de Khachaturian atrás mencionada um bom exemplo desta situação, eram quase desconcertantes no seu poder e imediaticidade.
Ouvir Claire Martin, em He Never Mentioned Love, FLAC, a 24 bit/96 kHz foi um verdadeiro prazer, com a voz de Claire a soar com uma suavidade de musselina e o piano a envolver essa mesma voz de uma maneira deliciosa, com cada nota a intercalar-se entre as palavras da cantora e formando em conjunto uma melodia tão harmoniosa. E ainda mais deliciado fiquei com James Taylor em Your Smiling Face, onde o ritmo era bem marcante, com a batida de bateria a aparecer não só com intensidade mas com o tempo quase perfeito, e a voz muito característica de James a soar com uma nitidez, com todas as vogais e consoantes tão claras e bem expressas que dava vontade de ouvir uma e outra vez logo de seguida.
E que dizer de There Is No Greater Love, do disco 4 Generations of Miles, com monstros sagrados tais como Ron Carter, Jimmy Cobb, George Coleman e Mike Stern a interpretarem ao vivo esta famosa peça, num tributo a Miles Davis, uma homenagem que faz todo o sentido, uma vez que todos eles tocaram, embora em momentos diferentes, com Miles Davis. O saxofone de Coleman tem momentos de um incrível virtuosismo, alternando com a bateria de Jimmy Cobb, ao mesmo tempo que o baixo de Ron Carter mantém uma presença quase constante, indispensável em qualquer boa reprodução de música de jazz, sem nunca se imiscuir demasiado no papel de cada um dos outros, mas conferindo «todo o sabor» à música.
E que gozo me deu ouvir um dos grandes clássicos do rock, os Led Zeppelin a interpretar Whole Lotta Love. Que vibração, que intensidade, que envolvimento se retiram desta grande música de rock, para passar depois a outra que até nem parece dos mesmos intérpretes, Stairway to Heaven , um rock calmo, tranquilo, com frases musicais bonitas até mais não, demonstrando uma vez mais que o 2.16 ultra não tem preferências por estilos musicais, como tem de ser – se a energia avassaladora está lá, então há que transferi-la para quem ouve, do mesmo modo que tudo o que seja calmo e melódico deve permanecer como tal.
A terminar (desta vez é que é mesmo) resolvi voltar às vozes femininas e reouvir Christine Collister, uma cantora que muito aprecio desde que a ouvi ao vivo numa visita à Rega, já lá vão muitos anos. Em Home is Where The Heart Is canta em conjunto com Clive Gregson e quer a voz forte, pujante, saída da alma e muito bem articulada de Christine quer a mais soto voce de Clive soam maravilhosamente bem, com alma e encanto, com as palavras cantadas a transmitirem na totalidade as emoções correspondentes à estrutura dos versos. Há algum tempo que não ouvia Christine e o 2.16 ultra fez-me sentir que essa não foi uma boa ideia…
Nota: Uma releitura desde texto fez-me lembrar que, apesar da sua extensão, não tinha incluído nele qualquer comentário sobre a performance do 2.16 ultra a ler ficheiros DSD, uma das coisas que ele, uma vez mais, faz mesmo muito bem. E foi uma boa quantidade de originais DSD que eu nele reproduzi, alguns mesmo transferidos directamente para a memória SSD interna e com resoluções tais como DSD 512. Menciono apenas uma pequena amostra de todos os que ouvi, retirados das minhas notas: Noches en los Jardines de España, de Falla, cheio de calor e romantismo; Trio para Piano e Cordas em Mi Menor, de Shostakovich, um sincopado brilhante de notas entre os três instrumentos com o violino a criar uma atmosfera ampla e aberta e a velocidade das notas a bater recordes da Fórmula 1; Vision of Her, de David Elias um som belíssimo com uma perfeita combinação entre a voz e o baixo; Like a Prayer, de Madonna, com as inevitáveis igualizações de estúdio que não se podem tirar, nada a fazer, não há milagres, mas o ritmo, a energia, a articulação perfeita entre a voz de Madonna e o coro são razões mais que suficientes para ouvirmos esta faixa até ao fim com enorme agrado. Num resumo final, a reproduzir DSD o 2.16 ultra tem uma performance aberta, detalhada, líquida e sem qualquer coloração que coloca na nossa frente quantidades altamente significativas de detalhe e envolvimento que nos cativam e prendem, fazendo-nos ouvir música por horas e horas sem qualquer ponta de fadiga, o que é o desiderato final de uma grande fonte de sinal.
Módulo opcional ultra USB bridge
Conclusão
Poderia ter mencionado muitas mais audições mas o texto já vai longo e terei apenas que dizer a concluir que este é, para todos os efeitos, um formidável leitor digital de áudio com uma performance que me faz pura e simplesmente classificá-lo como o melhor streamer que alguma vez ouvi no meu sistema (e talvez fora dele). O hardware interno é de primeira qualidade, a ergonomia com o novo sistema operativo Roon acima de qualquer crítica, apenas o preço é razoavelmente elevado mas esta é uma máquina que se coloca num padrão elevadíssimo de qualidade, o que torna muito difícil para mim entrar numa discussão intensa sobre este tema, até porque seguramente há custos de desenvolvimento bem elevados que tiveram de ser levados em consideração para se chegar a esta solução única. Ouçam-no e vão ver como tenho razão.
Já mesmo no final do teste resolvi fazer como que uma comparação A/B dos dois módulos USB, o original e a versão ultra que levou 18 meses a desenvolver. Digo apenas que foi apenas para ficar de vez absolutamente convencido que a versão ultra é qualquer coisa de muito especial. Com a versão ultra o som ganha um corpo imponente mas nunca exagerado, uma capacidade inebriante de reprodução dos mais ínfimos detalhes e um ritmo assinalável, sem perder nada da espacialidade e transparência que parecem ser um apanágio do 2.16 ultra. Quem tem um equipamento destes em casa ou pretende vir a comprá-lo, deverá seguramente considerar este upgrade porque depois de ter a USB Bridge ultra no sítio não há como voltar atrás!
Streamer Pink Faun 2.16 ultra
Preço 28 350 €
Placa ultra USB Bridge
Preço 4 400 €
RepresentanteAjasom