A música deve ser ouvida, não pensada.
Uma verdade quase universal é que a grande maioria dos audiófilos acabam por ser algo solitários, vivendo experiências musicais em torno do seu sistema Há que ter muito cuidado com a criação de um nicho social que acaba por levar a comprar / ouvir gravações com o fim único de reproduzir características audiófilas em tornos de determinadas zonas de frequência ou de detalhes específicos. Seria muito bom abrir espaços em volta para usufruir ou mesmo adquirir em conjunto com a família ou amigos exemplos de boa música, seja ela ou não da máxima qualidade audiófila, pois o mais importante é viver as emoções das obras marcantes e partilhá-las de modo a criar uma atmosfera comum de entendimento e agrado em volta de um acontecimento único. Pensar muito em volta da audição pura, procurando discernir este ou aquele som, aquele detalhe espacial ou o local perfeito de audição devem ser aspectos complementares a essas emoções mas nunca o fim último em vista. A ideia deverá ser sempre «sentir» a música em vez de a pensar.
O dCS Varese acabou com a dicotomia digital / analógico.
Para atingir estes desidérios, Ricardo considera que temos no momento em que vivemos, ou seja, no ano de 2025, equipamentos que mudaram o paradigma da audição. Apenas como um exemplo, o dCS Varese acabou finalmente com a dicotomia digital / analógico, conferindo à música que reproduz aquela capacidade emocional extra que alguns associavam apenas ao analógico, ou mesmo exclusivamente aos discos de vinilo. Já não há clube digital e clube analógico funcionando isolados entre si – a boa música é para ser partilhada, independentemente do formato, e essas duas áreas devem ser complementares uma da outra. Isto embora haja quem jure pela fita e pelo vinilo, atribuindo-lhes uma sonoridade bem definida que agrada, quase como que um certo calor. Novamente segundo Ricardo (e eu estou totalmente de acordo com isso), os NAS nunca foram pensados para trabalharem com ficheiros digitais de áudio e um bom servidor local dedicado é uma solução de muito melhor qualidade. Ao mesmo tempo, o streaming é uma boa ferramenta de pesquisa que permite ouvir antecipadamente faixas para que possamos perceber se vale a pena comprar depois a mesma gravação em vinilo ou CD.
.A razão principal para ter boa música em casa é para a ouvir e podermos falar dela e das sensações que nos causa a sua audição. Ricardo acha que em muitos casos se dá demasiada atenção ao que se escreve nos testes, o que pode até provocar situações de menos satisfação quando o possuidor de um equipamento que muito preza vêm um determinado crítico não lhe atribuir os níveis de qualidade e performance que ele acha lhe devem ser conferidos. Ao mesmo tempo, como pessoa informada que é, Ricardo tem seguido com alguma atenção os fóruns de Internet nos quais peroram sobre tudo e alguma coisa como se já soubessem tudo sobre tudo quando em muitos casos nunca ouviram um bom sistema de áudio a tocar como realmente pode tocar. No fundo não sabem nada, pois a grande sabedoria está em reconhecer que não se sabe nada e que o grande prazer que existe na vida e nunca se deve exaurir é o de aprender mais e mais. Como é possível que internautas que poucas vezes saíram da frente dos ecrãs do seu PC, se armem em defensores absolutos de uma verdade só deles, verdade essa com que nunca foram confrontados e, como tal, não podem conhecer? E isto sem falar nos que avaliam a performance de sistema e equipamentos através de vídeos do YouTube, com som MP3 transmitido no melhor dos casos a 150 kbits/s. Teriam muito mais a aprender se contactassem com especialistas que realmente sabem algo para daí retirarem mais ensinamentos.
Em contraponto a estas posições, confidenciou-me Ricardo que tem em Inglaterra um conjunto de clientes que quase que nem sequer sabem as marcas dos equipamentos, o que mostra que eles atingiram o seu objectivo final de se interessarem muito mais pela música que ouvem que pelas ferramentas utilizadas para a reproduzir. Por aproximações sucessivas, pode-se chegar a um grande sistema capaz de reproduzir 95 a 97% da realidade musical, mas isso não acontece necessariamente num dia nem na primeira combinação de equipamentos. As opiniões demasiado fortes e cheias de convencimento acabam por afastar quem quer entrar no mundo do áudio e a única solução é diluí-las um pouco, respeitando e ouvindo com compreensão quem está verdadeiramente interessado no fim último do nosso hobby: ouvir música com plena emoção e com a melhor qualidade possível.
E aqui entra um aspecto fundamental que tem a ver com a filosofia da Audio / Audio e Cinema em Casa que sempre foi a de disponibilizar aos nossos leitores possibilidades de acesso a opiniões sobre produtos e equipamentos de qualidade relevante, mais ou menos caros, sem impor barreiras de qualquer tipo, antes pelo contrário, disponibilizando informação isenta e o mais completa possível sobre aspectos ligados às tecnologias neles empregues e à performance que atingem em sistema bem conhecidos de cada um dos elementos da equipa. Fica do lado de quem recebe toda essa informação a decisão final sobre se se quer deslocar a um ponto de venda para apreciar por si mesmo se o equipamento em causa responde aos requisitos que ele próprio definiu, nem mais nem menos.
A Audio Research foi uma das primeiras marcas representadas pela Absolute Sounds e continua a ser uma daquelas pelas qual Ricardo nutre o maior carinho e respeito.
O fecho desta entrevista poderia ser muito bem este, mas Ricardo não se contenta com isso e deixou comigo aquilo que ele define como a ambição máxima da Absolute Sounds: almeja ele que seja possível que uma pessoa chegue a casa e a emoção gerada por uma reprodução musical seja tão boa ou melhor do que a comunhão absoluta com a ou o seu parceiro, a satisfação de uma boa refeição, o degustar de um bom vinho, enfim, preencha os nossos sentidos de uma maneira absoluta, de um modo que se aproxime a quase 100% do que sentimos no lugar ideal de um boa sala de concerto ou, caso não consigamos nesta algo melhor que um «galinheiro», esse valor pode então mesmo ultrapassar os 100%, porque na sala ficámos muito longe do posicionamento ideal e em casa temos uma perspectiva optimizada da orquestra. Depois disto, nada mais será necessário dizer da minha parte!