Um som de excepção com enorme clareza e transparência e, ao mesmo tempo, íntimo e realista.
Tem sido comum nos tempos mais recentes a Ultimate Audio organizar eventos nas suas de lojas de Lisboa e do Porto, mostrando os muitos produtos de topo que a marca representa - mas nos primeiros dias de Abril a Ultimate decidiu, e ainda bem, organizar uma das suas Extreme Sessions (sessões dedicadas ao high-end audio) no histórico Hotel Palace, no Estoril. Devido à profusão de eventos de alta-fidelidade que povoaram esse fim-de-semana foi necessário dividir tarefas e coube-me a mim reportar sobre o que vi e, mais importante, ouvi nestas sessões - tendo felizmente conseguir passar várias horas ininterruptas ao longo de dois dos três dias das mesmas, esperando assim que este reporte se torne mais fidedigno desta forma.
Começo por fazer uma nota prévia: já tive todo o género de experiências com o mercado high-end em diversas lojas e shows - sistemas que adorei, sistemas que não me aqueceram nem arrefeceram, sistemas de que não gostei e sistemas que achei que foram desenhados mais para serem objectos de luxo do que para ouvir música. Isto serve para reforçar que as muito elogiosas linhas que se seguem não vêm de alguém isento de espírito crítico ou de nenhuma espécie de «frete» (que nem nunca faria nem nunca a Ultimate me pediria para fazer), mas correspondem a uma opinião sincera e honesta (e que me pareceu ser correspondida por quase todos os que estiveram presentes naquela sala que, felizmente, foram bastantes).
O sistema montado pela Ultimate Audio era então constituído por amplificação da Halcro (pré-amplificador Equinox com fonte de alimentação externa, e dois amplificadores de potência mono Eclipse), sistema digital Taiko (modelo Olympus, que pela primeira vez inclui DAC) e as colunas Stenheim Alumine Five SX - aos quais ainda se juntavam cabos Siltech Master Crown (os topo de gama da marca holandesa), um estabilizador de corrente da Isotek e racks da Neo HighEnd (muito bonitas e a combinarem na perfeição com a elegância da sala e do hotel). Na parte analógica foi possível ouvir o gira-discos Clearaudio Master Jubilee e o DS Audio Grand Master EX como pré-amplificador de phono (e que segundo percebi não funciona nos mais comuns MM ou MC, mas num formato proprietário da Toshiba que cobre as tecnologias de leitura de discos de vinilo utilizando tecnologia óptica).
Feitas as apresentações, gostaria de falar um pouco sobre a Halcro e a Stenheim, que eram as duas grandes novidades que a Ultimate trazia para esta sessão (não que as outras marcas não justificassem também algumas palavras, mas há que evitar um artigo excessivamente longo e essas marcas já serão mais conhecidas dos habitués das lojas Ultimate). Começando pela Halcro, estamos a falar de uma marca australiana, que se dedica exclusivamente à amplificação e que conta apenas com um pré-amplificador e dois amplificadores de potência (mono e estéreo) no seu portfólio. Depois de uma entrada de leão no mercado da alta-fidelidade no início dos anos 2000 e após alguns anos de sucesso, a marca foi abandonada após o grupo a que pertencia ter sido comprado por outro grupo - até que em 2023 um grupo de engenheiros decidiu comprar a marca e ressuscitá-la, o que nos permite voltar a desfrutar destes amplificadores de topo. Tecnicamente, o pré-amplificador usa uma fonte de alimentação comutada tecnologia que tem voltado em força aos produtos high-end, em marcas como a Constellation Audio (recentemente, nas novas gamas Revelation 2 e Inspiration 2), a NAD ou a Benchmark (deixo um link em baixo, para quem tenha interesse, onde a Benchmark explica algumas vantagens desta tecnologia) - enquanto o amplificador mono de potência atinge os 280 W a 8 ohm e os 500 W a 4 ohm (para quem gosta de medições, fica também um link a mostrar a extraordinária performance do prévio Equinox neste departamento). E, para finalizar, achei particularmente interessante o controle remoto, com um botão de volume a «simular» o botão do próprio pré-amplificador, solução que também já tinha encontrado na linha North da Simaudio.
https://benchmarkmedia.com/blogs/application_notes/152143111-audio-myth-switching-power-supplies-are-noisy?srsltid=AfmBOooAvyWs9vi-r2BE0AT7fj1lisSEL3-PdfOgRq1_UJLGdc9uS9Wy
https://halcro.com/wp-content/uploads/2025/02/AHF539-Halcro-Equinox-Review.pdf
Quanto à Stenheim, trata-se de uma marca suíça de altifalantes fundada em 2010, e que se dedica essencialmente ao fabrico de colunas de topo em alumínio (colunas essas feitas à mão na própria Suíça). Com duas linhas de produtos (Alumine e Reference), a marca tem-se destacado não só pelos muitos prémios e elogios da crítica, mas também por ter ganho, por exemplo, o prémios “Best in Show” nos shows de Axpona e Munique, um feito notável. As Stenheim Alumine Five SX são então uma variação do modelo original, com um crossover com componentes melhorados e uso de melhor cablagem interna, para além da adição de uma plataforma onde as colunas assentam, garantindo assim maior estabilidade e rigidez, e menor interacção com o chão, e contam ainda com um controlo de equalização retirado da linha Reference e que actua nos agudos e nos graves, permitindo um melhor ajuste a cada sala específica (e que, para os mais puristas, estiveram sempre flat durante estas sessões). Com dois woofers de 10 polegadas, um altifalante de médios de 6.5 polegadas e um tweeter de seda de 1 polegada (estes dois últimos em disposição assimétrica), estas Five SX contam ainda com uma resposta de frequência que desce a uns impressionantes 28 Hz, uma impedância nominal de 8 ohm (mínima de 3 ohm) e uma sensibilidade de 94 dB, o que as deverá tornar relativamente agnósticas quanto à escolha de amplificação - sendo ainda de notar que cada uma pesa cerca de 140 kg!
E já chega de rodeios, parece-me - indo directo ao ponto, este sistema apresentado pela Ultimate é o melhor sistema que ouvi em toda a minha vida, sem sombra de dúvida, derrubando até alguns preconceitos que tinha com o high-end. Não é nada fácil descrever som sem cair em lugares-comuns, adjectivações excessivas, hipérboles ou esoterismos desnecessários, particularmente quando quero descrever fielmente um sistema de que gostei tanto, mas darei o meu melhor para me manter elogioso e sóbrio ao mesmo tempo, tarefa que se revela antecipadamente algo difícil.
A primeira característica mais evidente foi uma enorme clareza e transparência, com um som muito aberto, mas sem que isso signifique agudos propositadamente elevados (como acontece com alguns modelos mais recentes da B&W, por exemplo, e que nessa marca britânica resulta muito bem) e, principalmente, sem que isso signifique fadiga auditiva. É relativamente comum sair de um show com bastante cansaço auditivo (por vezes por causa do volume excessivo, outras vezes devido aos próprios sistemas), mas desta vez isso não me aconteceu, e tratou-se de duas sessões bastante longas - foi a primeira vez que ouvi um sistema tão transparente e tão pouco cansativo.
A segunda característica que me chamou a atenção foi a capacidade que o sistema teve de soar íntimo e realista no que toca à escala dos instrumentos, sendo que precisamente aqui jaz o meu problema com muitos sistemas high end - uma voz e uma guitarra demasiadas vezes soam à primeira fila um concerto de rock em Wembley em vez de soarem à escala correcta. Isso nunca aconteceu aqui, e foram demonstradas diversas faixas com apenas voz e acompanhamento, ou pequenos ensembles e consegui sempre sentir uma ligação íntima com estas formações e ouvi-las no «tamanho» certo.
Uma terceira característica deste sistema foi que, apesar de ser muito transparente, nunca soou frio ou analítico, e, talvez mais surpreendente, nunca soou cruel com gravações menores - um problema recorrente de sistemas high-end é só soarem bem com gravações de topo, mas aqui não foi o caso. Quer em discos ao vivo (onde a qualidade da gravação é quase sempre inferior), quer no disco Red Garland’s Piano, um pedido meu, e onde a qualidade da gravação reflecte as muitas limitações tecnológicas de 1957, foi sempre um prazer ouvir música com este conjunto - não deixando de se notar as insuficiências das gravações, isso nunca obstaculizou que se desfrutasse em pleno da música a ser reproduzida.