Uma parelha de referência a todos os níveis
Audições
Comecei então as audições munido de umas KEF LS50 (versão original) e de um Eversolo A6 Master Edition Gen2, que serviu principalmente como transporte digital para o 9000Q (por ligação USB e com atenuação digital de -3 dB, usando o excelente Eversolo Volume Control), mas também ocasionalmente como streamer (usando as saídas analógicas XLR, completamente balanceadas, para as entradas também XLR e também completamente balanceadas do 9000Q), para garantir que o 9000Q também funcionava e soava devidamente apenas como pré-amplificador analógico, retirando a sua excelente secção digital da equação. Sempre que haja omissão do modo, o texto que se segue refere-se ao uso do Eversolo como transporte digital para o DAC do 9000Q, quando o caso for o do uso do streamer, tal será indicado. A música foi “servida” pelo MinimServer, alocado num NAS recheado de ficheiros FLAC, excepto quando for indicado o uso de Qobuz.
E o primeiro disco escolhido para ouvir estes Audiolab foi o recém-lançado Speaking from the Heart (2025, Double Moon Records, Peak -0,86 dB, DR11, 24/96), do pianista alemão Lukas Mohl, em trio com o contrabaixista Jasper Somsen e o baterista Min Won. Disco de estreia de Lukas, muito bem gravado, foi possível aqui começar a perceber alguns dos traços sonoros da dupla 9000Q/9000P - o primeiro talvez mais evidente é a total ausência de agressividade no som. Essa característica, na alta-fidelidade, é muitas vezes atingida retirando impacto e velocidade aos transientes e atenuando, por vezes significativamente, as frequências mais altas, mas esse não é o caso aqui. Há muito detalhe e resolução, com agudos presentes e extensos, e transientes com presença e dinâmica (o piano é talvez o instrumento onde melhor se percebe isso) mas sem que isso agrida os novos ouvidos ou a escuta se torne cansativa com as horas a passar. Um balanço difícil, que já tive a sorte de encontrar em outros produtos, mas que atinge aqui talvez o seu pináculo de execução nesta gama de preço. Também o contrabaixo se apresenta com excelentes timbres e presença, e com uma definição que não ouvi muitas vezes neste sistema - o que foi particularmente evidente no tema Defiance, por volta do 2:40, quando Jasper Somsen inicia o walking bass.
Parti depois para o intemporal ...Nothing like the Sun (1987, edição Mobile Fidelity, Peak +0,19 dB, DR15, 16/44,1), do cantor, baixista e compositor britânico Sting, que creio dispensar apresentações. Rodeado de uma equipa de luxo «roubada» ao jazz e ao rock, cuja lista é demasiado longa para apresentar aqui, este disco representa o melhor da carreira de Sting a solo e está também um muito bem gravado e produzido, mesmo no original, mas aqui foi escutado ainda melhor na versão da Mobile Fidelity, remasterizada por Bob Ludwig. A primeira boa impressão vem dos timbres e transientes da bateria, tanto no rimshot como no ataque da baqueta na tarola, e ainda na pujança e presença do bombo, um componente da bateria que «desaparece» com muita facilidade, quando o equipamento (ou a gravação) não tem resolução / definição suficientes para o mostrar. Também o palco, importante nesta música pop mais orquestral, com a presença constante de muitos instrumentos e texturas em simultâneo, é bastante largo e profundo mas sem que o som perca foco e coesão, com uma excelente sensação de imersão - não atinge neste departamento o que os sistemas High- End atingem, claro, mas tal nem seria de esperar nesta gama de preço. Os timbres, perfeitos - como exemplos poderia referir a voz de Sting e o (magnífico) soprano de Branford Marsalis, o baixo em They Dance Alone ou a guitarra cordas de nylon de Stingcom em Fragile (ao contrário do que muitos pensam é mesmo Sting quem toca guitarra nessa faixa, e não o seu famoso guitarrista, Dominic Miller).
Aproveitei aqui para reouvir o mesmo disco, mas desta evz usando o Eversolo A6 Master Edition Gen 2 com o streamer ligado às entradas XLR do 9000Q, agora apenas como pré-amplificador analógico - onde se comportou com total neutralidade, como se pede a um pré-amplificador, beneficiando também de receber do Eversolo um sinal completamente balanceado. Com um bom controlo remoto (talvez apenas demasiado grande), e com muita precisão na regulação do volume, o 9000Q mostrou que não tem apenas uma excelente secção digital mas que, apenas como pré-amplificador, consegue fazer o que se pede a um componente destes: regulação de volume precisa e a nunca se dar por ele (em inglês, e como dizia Peter Walker, da QUAD:straight wire with gain). Na comparação das duas secções digitais, gostei (um pouco) mais da secção do 9000Q, que me soou ligeiramente mais aberta que a do Eversolo, ou seja, com mais clareza e resolução - mas estamos claramente no domínio do nit-picking - o Eversolo, nesta sua versão Master Edition, é, como o 9000Q, um produto difícil de bater no seu segmento e na sua gama de preço. Deixo ainda uma nota final para os cabos Audiofidem, fabricados por Jorge Tavares - usei um para XLR/XLR para fazer esta parte do teste e teve um comportamento exemplar.
Passando para a música clássica e para o Qobuz Connect, escolhi o disco Shostakovich: Symphonies Nos. 2, 3, 12 & 13 (2023, 24/96), da Boston Symphony Orchestra, conduzida, como habitualmente, pelo maestro letão Andris Nelsons. O compositor Russo, que começou por obras mais avant-garde (em linha com o que era comum na época), virou-se depois para um estilo de composição muito mais acessível (veja-se o exemplo da sua Jazz Waltz, presente no celebrado filme De Olhos Bem Fechados, de Stanley Kubrick), principalmente por imposição da União Soviética e de Joseph Stalin, embora tenha posteriormente regressado ao seu estilo inicial. Muito bem gravado e interpretado, este «disco» conta com quase três horas de música magnífica, do melhor que o século XX produziu. E, ao longo dessas três horas, a dupla 9000Q/9000P produziu timbres e dinâmicas exemplares, ao nível do melhor que já ouvi nesta gama de preço - a música clássica é sempre um teste exigente a qualquer sistema, e os Audiolab estiveram completamente à altura, com particular destaque para o peso e realismo das percussões, para a total nitidez dos pizzicato nos contrabaixos e os belíssimos timbres dos muitos instrumentos de sopro que se ouvem ao longo deste álbum. Repetindo o que disse atrás, tendo em conta o preço bastante acessível deste conjunto, os resultados sonoros são deveras impressionantes, e a prova disso mesmo foi ter ouvido as quase três horas deste disco de uma ponta à outra. Aproveitei também aqui para fazer um breve teste à saída de auscultadores, munido de uns Sennheiser HD 700 e de alguma inexperiência na área - e, tendo gostado dos resultados, devo admitir que a saída de auscultadores não me impressionou tanto como tudo o resto me impressionou no 9000Q, o que pode ser apenas uma questão de expectativas demasiado altas, tendo em conta o quanto estava a gostar de ouvir este pré-amplificador, ou de sinergia específica com os Sennheiser HD 700. No entanto, é óptimo que o 9000Q tenha esta funcionalidade, e foi certamente útil e muito agradável ouvir música depois das dez da noite neste formato.
Conclusão
Dentro da minha experiência na alta-fidelidade, ainda não encontrei quem faça melhores DACs acessíveis que a Audiolab - embora haja, claro, muitos e bons DACs por aí (e muitos que ainda não experimentei, que a oferta é muita e variada). E, se muitas vezes os DACs acoplados a amplificadores integrados ou a préamplificadores oscilam entre decentes e bons, este não é o caso com o 9000Q, que apresenta aqui uma secção digital de topo, que, na minha opinião, só será ultrapassada de forma significativa por DACs independentes na casa dos cinco dígitos. Juntado a isso um preço acessível, um circuito completamente balanceado, um som muito pouco colorido e muito pouco cansativo, generosas entradas digitais e analógicas, uma saída de auscultadores prática e muito funcional, e ainda uma regulação de volume muito precisa, o 9000Q é uma oferta quase irrecusável. Teria sido interessante ver uma entrada ARC/eARC para televisão e a equalização funciona bem mas, para além de não permitir usar o modo balanceado, tem saltos demasiado grandes (2 dB) - mas tudo isto são pormenores, num produto muito bem pensado e executado (também a presença de um botão para rodar o volume me soube muito bem, depois de ter testado uns quantos amplificadores de seguida que não tinham essa opção).
O 9000P é também um muito bom amplificador de potência, com um som polido e refinado, que não introduz qualquer cansaço auditivo, mesmo em audições mais longas, e que faz uma excelente parelha (visual e sonora) com o 9000Q - embora tenha ficado curioso de ouvir o 9000Q com um amplificador de potência com mais potência, um pouco mais de músculo e um circuito completamente balanceado (leia-se, numa gama de preço muito diferente do 9000P). E reside aqui uma das grandes vantagens de um sistema modular (pré-amplificador e amplificador) face a um integrado - é muito mais simples, mais tarde, alterar apenas uma das peças por outra mais do agrado do cliente (já as supostas vantagens sonoras mais técnicas me deixam mais reservas, creio que o mais importante é um produto ser bem desenhado e bem construído, seja em modo separados ou em modo integrado).
Já ouvi outros boas propostas de amplificação nesta gama de preço, mas esta dupla fica a minha referência actual para quem busca um som mais moderno (leia-se, neutro e sem a atenuação de agudos / resolução e de velocidade que geralmente ocorre em produtos que propositadamente apontam a um som mais vintage) a um preço acessível. Fica então uma recomendação entusiástica desta dupla Audiolab, à qual se deve juntar um bom transporte digital (idealmente, com um bom controle de volume digital, para evitar clipping no filtro de upsampling) e um bom par de colunas. A partir daí, é só desfrutar, e há mesmo muito para desfrutar nesta dupla, que é a melhor introdução acessível ao mundo dos componentes separados que ouvi até hoje. Fica ainda um agradecimento à equipa da Sarte Audio, em especial à Ada Rubio-Iglesias, de quem partiu a (excelente) ideia de testar estes Audiolab.
Audiolab 9000Q/9000P
Preços:
9000Q 1799 €
9000P 1499 €
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